O que é videolaparoscopia?
A cirurgia videolaparoscópica é uma técnica minimamente invasica e recente na história da cirurgia, sendo a primeira cirurgia realizada em 1985 pelo alemão Erich Mühe de Böblingen e consiste em uma técnica minimamente invasiva onde não são feitos os cortes habituais para o acesso a cavidade promovendo uma série de benefício para os pacientes e fornecendo a equipe cirúrgica habilidades adicionais no tratamento das doenças cirúrgicas.
2 – Vantagens da videolaparoscopia
Muito além das vantagens estéticas, a cirurgia por videolaparoscopia confere vantagens técnicas para o cirurgião e melhores desfechos objetivos para a paciente.
Tecnicamente a cirurgia laparoscópica trabalha com um aumento de 8x da imagem na distância de trabalho padrão. Isso significa que o cirurgião pode visualizar estruturas e detalhes mínimos, que não seriam possíveis a olho nu.
Quando diminuímos a distância focal da câmera, o aumento chega a ser de 30x, ou seja, operamos com um verdadeiro miscroscópio amador! Essa característica da cirurgia laparoscopica é extremamente importante para identificação de pequenos focos de Endometriose ou Metástases de câncer.
Com um aumento desse calibre, as pinças da cirurgia laparoscópica que são introduzidas pelos trocateres também tem um pequeno tamanho, sendo muito mais delicadas e precisas que a mão humana. Com isso, temos uma manipulação muito mais fina e gentil dos órgãos o que confere melhores desfechos de pós-operatório.
Por fim, no caso da cirurgia pélvica em especifico, temos a vantagem da ergonomia para o cirurgião.
A pelve é um oco ósseo e quando operamos por via tradicional aberta (laparotomia) temos que nos curvar em campo para ver as estruturas que estarão com sombras da parede pélvica.
Desconforto ergonômico, má visualização de estruturas e ausência do aumento laparoscópico restringem muito a qualidade técnica na cirurgia pélvica aberta!
Todas essas vantagens técnicas conferem vantagens para o resultado dos pacientes também. A internação e a recuperação da laparoscopia são muito mais rápidas que as da cirurgia aberta.
Antigamente as pacientes dormiam 2 ou 3 noites no hospital, levando até 60 dias para retornas suas atividades. Hoje a maioria das cirurgias tem alta no mesmo dia ou dia seguinte e a maioria das paciente retorna às suas atividades em 10-14 dias.
A quantidade de sangramento é reduzida, a quantidade de infecções é reduzida e especialmente a quantidade de dor é muito reduzida!
3 – A anestesia na cirurgia laparoscópica
A anestesia na cirurgia laparoscópica será sempre geral, se a cirurgia for durar 5 minutos ou 5 horas. Qual o motivo?
Durante a cirurgia laparoscópica precisamos encher a barriga do paciente com CO2 (gás carbônico), isso cria o espaço para podermos fazer o procedimento cirúrgico. Esse gás deixa a barriga “inchada”.
Faça o seguinte teste: distenda sua barriga (pra ficar com aquele barrigão do seu boneco) e tente respirar? Você não consegue, certo? O mesmo sucede durante a cirurgia laparoscópica e por isso mesmo procedimentos simples e rápidos necessitam de anestesia geral para que o paciente seja intubado e receba a assistência ventilatória!
E aqui reside também um dos maiores incômodos no pós-operatório, o próprio gás usado que demora um pouco a ser rabsorvido! É comum o paciente sentir a sensação de plenitude abdominal e também é muito comum uma dor no ombro e escapulas, indo para o meio das costas pela irritação do nervo frênico!
4 – Pré e pós operatório na cirurgia laparoscópica
O preparo pré-operatório na cirurgia laparoscópica é similar para outras cirurgias, com o paciente devendo obedecer jejum, horário de chegada e outras orientações que estão no arquivo “orientações gerais pré-operatório”.
O pós operatório na cirurgia laparoscópica, de uma maneira geral, é acelerado quando em comparação com a cirurgia aberta. A grande maioria das pacientes necessitará apenas de uma noite no hospital, com algumas podendo mesmo ter alta no mesmo dia.
O maior incômodo imediato no geral não é a dor e sim a distensão do gás do pneumoperitônio. O paciente deve focar em deambular precocemente e o máximo que o desconforto permitir, essa é a medida chave na reabsorção do pneumoperitônio e melhora desse incômodo.
Outro incomodo comum é na garganta, uma sensação de pigarro que não melhora.
Isso acontece devido a presença do tubo orotraqueal necessário a anestesia geral.
De uma maneira geral a maior parte dos pacientes terá mais incomodo entre o 1-5 dia, com retorno a quase normalidade entre o 5-10 e estará apto a atividades laborativas sem esforço entre o 10-15 dias.
7 – Os furinhos e a dor no umbigo
Na cirurgia laparoscópica ginecológica, de uma maneira geral usamos um trocater de 1 cm pelo umbigo por onde é introduzida a câmera, dois trocateres de 0.5cm abaixo da linha do bíquini e um trocater de 5mm à esquerda.
São cicatrizes mínimas, que ficam escondidas dentro do umbigo e abaixo da roupa. A única que será possível visualizar é a da esquerda superior, porém ela tem apenas 5mm e a depender da cicatrização da paciente também pode ficar imperceptível.
De uma maneira geral, as cicatrizes laterais doem menos, com a cicatriz umbilical sendo a que mais causa incômodo. Isso decorre do fato de ser ali a introdução do trocater de maior tamanho e da câmera. Como essa última está se movimentando durante todo o procedimento cirúrgico, isso gera maior trauma e comppressão local, que findam em mais dor. Além disso, a região umbilical já é por si só uma região muito mais sensível!
8 – Muito grande para laparoscopia?
Doutor, mas como você vai tirar meu utero que está aumentado se está usando somente furinhos de milímetros para operar? Não é magia, é tecnologia!
Existem várias maneiras de se retirar peças maiores sem precisar realizar grandes incisões na parede abdominal e na ginecologia ainda temos uma via de saída excelente, chamada vagina! Se por ali a mulher normalmente consegue parir crianças de 3.5 kg, conseguimos extrair facilmente peças que ultrapassam 1kg de peso.
Também é possível fazer mini-incisões na altura da cesariana ou no umbigo e usar dispositivos de proteção e afastamento da parede abdominal que permitem essas extrações.
9 – Retirada do útero (Histerectomia)
A histerectomia é a cirurgia mais realizada na ginecologia e pode ser feita por cirurgia laparoscópica com facilidade sendo essa uma das vias preferíveis junto a via vaginal.
Nesses casos, inclusive, é muito fácil retirar a peça uma vez que já vamos abrir a vagina dentro do passo-a-passo da retirada do útero.
Na enorme maioria dos casos será realizada a histerectomia total, retirando o útero, seu corpo e colo, junto com as trompas. Lembrando que as trompas são sempre retiradas pois são um sabido fator de risco para o Câncer de Ovário!
Mesmo úteros muito grandes podem ser retirados por vídeo? Sim praticamente todos os casos são exequíveis por laparoscopia, mesmo em úteros imensos e que pesam quilos! O tamanho em si não importa, importa mais a segurança de acesso aos pedículos vasculares e nervosos e proteção da via urinária. Caso se garanta a segurança desses quesitos, qualquer tamanho de útero pode ser operado por vídeo.
Porém, nesses últimos casos o risco de conversão da cirurgia por via lapatômica (aberta) é maior! O tempo operatório e o trabalho cirúrgico também aumentar, cirurgias que durariam 1-2 horas passam a durar 3-4 horas, porém esse é um trabalho a mais que vale a pena quando vemos a recuperação da paciente!
10 – Miomectomia laparoscópica
Os miomas de posição subserosa e intramural podem e devem ser abordados preferencialmente por vídeo!
A miomectomia na cirurgia laparoscópica é sempre desafiadora, pois exige uma velocidade e habilidade maior de sutura laparoscópica, que é a parte mais difícil dentro da técnica laparoscópica. Com isso, assim como nos úteros grandes, a miomectomia laparoscópica pode demorar bem mais que a via aberta e ter um pós operatório um pouco mais demorado que a laparoscopia normal, mas ainda assim muito superior ao da via aberta.
Em casos de múltiplos miomas e miomas muito grandes, deve-se pesar com sabedoria o custo e benefício da via laparoscópica, até porque a via aberta para miomectomia no geral necessita de uma pequena incisão. O que é melhor para a paciente? Um corte e uma cirurgia de 1:30 ou a via laparoscópica e uma anestesia geral de 6 horas?
Devemos ponderar com cautela a via nesses casos em específico!
11 – Cirurgia dos Ovários
A cirurgia dos ovários com características benignas também é preferencialmente executada cirurgia laparoscópica. Essa via é ideal para lesões císticas simples e teratomas, mesmo os de muito volume! Paciente que pela via aberta passariam duas noites no hospital operam por vídeo em tempos cirúrgicos curtíssimos e comumente recebem alta no mesmo dia caso a cirurgia tenha sido realizada no período da manha.
A ooforectomia consiste na retirada do ovário inteiro, devendo ser evitada sempre que possível, especialmente nas pacientes que ainda não contém prole constituída. A ooforoplastia consiste na retirada apenas da lesão, preservando o ovário. Na grande maioria das vezes é possível preservar o ovário e essa deve ser a intenção do cirurgião!
O caso onde é arriscado a cirurgia videolaparoscópica no ovário acontece nas lesão suspeitas de câncer e de grande volume. Essas lesões no geral possuem conteúdo cístico com células cancerígenas que caso o ovário se rompa, serão espalhadas na cavidade. Nesses casos é preferível a via lapatômica (aberta) tradicional!
12 – Correção de prolapsos e incontinência
A maior parte das correções de prolapsos e incontinência é feita por via vaginal, sendo essa a via preferencial para esses procedimentos. Isso decorre principalmente do fato que pela via vaginal a paciente tem uma cirurgia menos invasiva e mais rápida, sem necessidade de anestesia geral e alta imediatamente após o procedimento.
Porém, existem alguns tipos de defeitos onde a via laparoscópica é a preferencial. No caso da incontinência urinária, a correção laparoscópica é considerada o padrão-ouro em resultados!
Porém, porque usamos mais os slings então?
A cirurgia laparoscópica para a incontinência urinária possui grande curva de aprendizado, com poucos cirurgiões a executando e um tempo estimado de 2-3 horas, enquanto o sling é de fácil execução e demora 15 minutos. Quando vamos indicar a cirurgia da incontinência por vídeo então? Quando já formos abordar a paciente por vídeo devido a outro problema, como uma lesão de anexo ou uma hidrossalpinge.
Nesses casos a cirurgia laparoscópica já está indicada por outro motivo e mantém-se a correção laparoscópica da incontinência como padrão ouro.
Outro caso é o de prolapso de cúpula vaginal, que acontece quando retiramos o útero da mulher e sucede um descenso da vagina que forma uma verdadeira “bola” na saída da vulva. Aqui também um procedimento de alta complexidade e realizado por poucos cirurgiões, mas que possui os melhores resultados.
Cistoceles, retoceles e a maior parte das cirurgias de Assoalho Pélvico vão ser melhor
abordadas pela cirurgia vaginal que pela laparoscopia!
13 – Tubas uterinas
A cirurgia de excisão das tubas uterinas devido a doenças como hidrossalpinge ou gravidez ectópica é preferencialmente realizada por cirurgia laparoscópica. A cirurgia por essa via é mais rápida e a maioria das pacientes terá alta no mesmo dia.
Outra cirurgia que possui importante benefício é a recanalização tubária. Essa era uma cirurgia feita antigamente por via aberta e necessidade de microscópio. Com o advento da laparoscopia e seu aumento visual intrínseco, essa também passou a ser uma cirurgia preferencialmente executada por essa via!
14 – Câncer e Endometriose
A cirurgia da endometriose é hoje dentro da ginecologia cirúrgica aquela onde a afirmação do uso da via laparoscópica é mais contundente a ponto de em muitos guidelines ser recomendado enviar a paciente a um um centro onde haja tal tecnologia “contra-indicando” a realização da via aberta nessas pacientes.
Identificação de lesões microscópicas e delicadeza de dissecção são os principais motivos! Portanto é inquestionavelmente o padrão ouro.
A cirurgia do câncer de endométrio é bem estabelecida como via laparoscópica e deve ser preferencial no tratamento dessas pacientes. A cirurgia do câncer de ovário deve ser bem selecionada, casos de grandes massas e alta suspeição devemos privilegiar o uso da laparoscopia!
Por fim, temos o câncer de colo uterino que no passado foi operado por vídeo, posteriormente tendo sido proscrito essa via devido a desfechos oncológicos. A maioria dos centros e especialistas hoje voltou a operar por videolaparoscopia, com mudanças nas técnicas originais. Porém, permanece uma zona de muita discussão na cirurgia oncoginecológica e esses casos devem ser bem individualizados e as decisões divididas com pacientes.