A Esquerda útero com endométrio e espessado e a direita endométrio normal.
O câncer de endométrio é o segundo câncer ginecológico mais comum no Brasil, sendo estimados mais de 7 mil casos por ano. Nos países desenvolvidos já é o primeiro câncer ginecológico, tendência que deve ser seguida pelo nosso país.
1 – O que é o Endométrio?
O endométrio é o tecido de revestimento interno do útero, que passa por diversas fases durante o ciclo menstrual.
Durante o ciclo menstrual esse tecido glandular sofre diversas alterações que visam torna-lo receptivo a um eventual óvulo fecundado. No início do ciclo menstrual o Endométrio se espessa e cresce, aguardando a fecundação. Quando ela não acontece, o endométrio descama e acontece a menstruação.
Após a menopausa, os ciclos menstruais deixam de acontecer e o endométrio não passa mais por esse ciclo tornando-se mais fino.
Toda vez que uma mulher sangra na menopausa isso deve ser considerado absolutamente ANORMAL e uma das principais causas é o câncer de endométrio.
2 – O que é a Hiperplasia de Endométrio?
Toda vez que usamos na medicina o termo hiperplasia, queremos dizer que houve um aumento no número de células de um órgão ou tecido. Esse aumento pode levar a tumores benignos ou malignos e ao aumento do tamanho do órgão.
A hiperplasia de endométrio é sabidamente um grande fator de risco para o câncer de endométrio e é considerada como uma lesão pré-maligna e precursora do câncer.
Existem vários tipos de hiperplasia e algumas classificações sobre o assunto.
Basicamente temos as hiperplasias simples, que no geral não possuem atipias, e que tem risco menor de se transformarem em doença maligna. Na outra ponta temos as hiperplasias complexas que no geral contém atípias e possuem grande potencial de malignidade, sendo rotineiramente abordadas pela retirada do útero.
3 – Sinais e Sintomas
O principal sintoma do câncer de endométrio é o sangramento pós menopausa. SEMPRE que ele acontecer devemos nos preocupar pois a chance do motivo ser malignidade varia entre 15-30%.
É MANDATÓRIO investigação da cavidade endometrial, preferencialmente por HISTEROSCOPIA que é considerado o padrão-ouro de investigação. Caso a histeroscopia não esteja disponível, é possível realizar curetagem para biópsia do material suspeito.
Outro sinal importante é a presença de sangramentos entre as menstruaçoes ou importante mudança no perfil de sangramento nas pacientes que ainda menstruam. O principal fator de risco seriam aquelas pacientes obesas e com mais de 40 anos onde devemos ter atenção especial nessas mudanças de padrão menstrual.
Mais raramente a paciente ainda pode ter sensação de massa pélvica, dor pélvica e perda de peso inexplicável.
4 – Principais Fatores de Risco
O principal fator de risco para o câncer de endométrio e para a hiperplasia de endométrio é a exposição prolongada ao estrogênio sem oposição da progesterona.
Esse é um cenário muito comum nas pacientes com obesidade, uma vez que a gordura subcutânea periférica é capaz de produzir estrogênio na forma de estrona e estimular o endométrio. Além disso pacientes obesas possuem maior quantidade de ciclos anovulatórios onde acontece a exposição ao estrogênio sem a adequada oposição da progesterona.
Outros fatores menos relevantes são a diabetes, ter tido uma primeira menstrução precoce, raca branca, ter tido uma menopausa tardia, ter mais de 50-60 anos e não ter tido filhos.
É imprescindível salientar a importância da história familiar e da genética no desenvolvimento do Câncer de endométrio, uma vez que o mesmo possui forte relação com outros cânceres como o câncer de Mama, Ovário e Intestino grosso (Cólon)
Por fim, um grupo muito especial é o das pacientes que tiveram câncer de mama e estão em uso de tamoxifeno. Essas pacientes apresentam risco aumentado de desenvolver espessamento endometrial e consequente câncer de endométrio, devendo possuir acompanhamento do endométrio durante o tratamento.
5 – Qual a espessura normal de um endométrio?
A espessura normal do endométrio não é bem estabelecida em pacientes que ainda menstruam, exatamente porque nessa fase o endométrio muda radicalmente sua composição e tamanho durante os ciclos. Porém, é interessante verificar endométrios mais espessos que 15-20 mm nessa fase correlacionando com dados clínicos.
Na mulher na pós menopausa é esperado um endométrio bem mais fino, sendo considerado anormal e indicativo de investigação qualquer espessura acima de 4mm. Naquelas pacientes que estão em uso de TRH, a espessura máxima admitida é de 8 mm e espessamentos superiores também devem ser investigados.
6 – Diagnóstico
O diagnóstico do câncer de endométrio é feito através da biópsia do endométrio e tem como padrão ouro a Histeroscopia. A Histeroscopia além de proporcionar uma biópsia dirigida, tem uma grande acurácia visual quanto a malignidade das lesões. Isso indica que visualmente o Histeroscopista já pode desconfiar de maneira importante de uma lesão! Mesmo sem patologia!
Outra possibilidade diagnóstica é a curetagem, feita nos casos onde a paciente não tem acesso a histeroscopia.
Outro exame que pode ajudar no raciocínio diagnóstico é o ultrassom transvaginal que ajuda a fazer diagnósticos diferenciais e medir o espessamento do endométrio.
7 – Estadiamento
O estadiamento é uma série de procedimentos adicionais que fazemos após a confirmação por biópsia no câncer de endométrio.
Quando disponíveis, é normalmente solicitado uma ressonância de abdome e pelve para avaliar a invasão da lesão no útero assim como possíveis sítios de metástases a distância.
Um outro exame solicitado é a tomografia de tórax que é superior na avaliação do parênquima pulmonar, outro sítio preferencial de metástases a distancia.
O diagnostico de metástases a distancia é o principal fator prognóstico para o câncer de endométrio e podemos alterar as condutas clinícas e cirúrgicas após essa avaliação.
8 – Tratamento Cirúrgico
O tratamento cirúrgico é baseado na cirurgia mínima de retirada do útero e das trompas. Em alguns casos selecionados é permitido oferecer a paciente a manutenção dos ovários, mas esses casos devem ser pesados com bastante atenção o custo benefício e não costuma ser a conduta mais comum.
Um tratamento muito comum complementar é a linfadenectomia que consiste na retirada dos gânglios e linfáticos da pelve e/ou próximos da artéria aorta.
Esses gânglios linfáticos pertencem ao sistema vascular linfático que é adicional ao nosso sistema arterial e venoso. Sabidamente esses gânglios são locais preferenciais de metástases e sua retirada é feita para essa pesquisa e estadiamento ou mesmo para tratamento quando os mesmos já estão acometidos.
Esse é um procedimento de alta complexidade e não é isento de riscos, especialmente por acontecer muito próximo a vasos de grande calibre. Além disso, temos complicações típicas desse procedimento como o Linfedema. Por esse motivo os pacientes devem ser bem selecionados para essa decisão que deve ser tomada em conjunto!
Uma opção mais recente e menos invasiva é o linfonodo sentinela. Nessa técnica ao invés de esvaziarmos toda a pelve focamos em retirar apenas gânglios principais que seriam sentinelas da doença e analisa-los de maneira acurada. Uma abordagem já bem estabelecida para subtipos menos agressivos e que vem sendo estudada para subtipos mais agressivos de câncer de endométrio também. Sua meta é dar o mesmo estadiamento da linfadenectomia, mas de uma maneira menos invasiva.
Todos esses procedimentos podem ser feitos por videolaparoscopia e robótica, sendo essas vias minimamente invasivas e dando melhor recuperação do paciente no pós operatório.
9 – Quimioterapia e Radioterapia
São tratamentos no geral complementares a cirurgia para o câncer de endométrio.
Por sorte, a temida quimioterapia vem sendo menos e menos indicada, ficando hoje basicamente restrita a casos mais avançados que não são o usual.
A radioterapia, muito menos mórbida em efeitos colaterais, é bastante utilizada em casos intermediários. Possui um perfil de efeitos colaterais muito mais aceitável que a quimioterapia e é bem aceita na maioria dos casos.
E podemos não fazer absolutamente nada! Em casos iniciais, a cirurgia sozinha é considerada curativa para o câncer de endométrio.
10 – Um final feliz?
Quer uma boa notícia se você tem esse câncer diagnosticado ou está em sua investigação?
Apesar de ninguém querer o diagnóstico de câncer de endométrio ele é um dos canceres com melhor prognóstico e a chance de cura ultrapassa 90% em 5 anos para os casos iniciais e continua acima de 50% para a maioria dos casos avançados.
Portanto se esse é o seu caso, não perca e esperança e busque o tratamento. Suas chances de cura são altas!
FONTES:
1 – Hiperplasia Endometrial e Câncer de Endométrio – Protocolos FEBRASGO 2021
2 – Berek e Novak, Ginecologic Oncology, 7 ed, 2021